segunda-feira, 5 de setembro de 2016



LIVRO:  Rimando a História
autora Dulce da Silva Meira



A Lagoa
Pág.: 45 a 49

Ao lado leste da vila
A lagoa se estendia.
Em suas águas serenas
A lua se refletia,
As aves se aninhavam,
Entre o golfo que floria.

Frangos d’água e chanans
Sobre o golfo caminhavam,
E ao sentirem perigo
Os filhotes mergulhavam
Cágados e jacarés
Sobre pedras sol tomavam.

Garças e Marias-pretas
Em cores a constrastar,
Aos socós se misturavam
E na água a caminhar,
Peixes, insetos, moluscos,
Todos tentavam pegar.

O martinho pescador
As águas sobrevoava,
E com visão aquilina
A boana acompanhava,
E num súbito mergulho
Da água peixe  tirava.

A partir do mês de  julho
Quando a seca iniciava,
Na depressão da lagoa
Em qualquer lugar minava.
E abrindo-se cacimbas
A água logo brotava.

Diminuindo a água,
Todas as plantas morriam,
As aves se arribavam,
E os batráquios fugiam.
Facilmente se pegava
Peixes que sobreviviam.

Foi em um  desses períodos,
Que resolveram fazer,
Um tanque que por mais tempo
Pudesse água conter,
Para o consumo doméstico
E a criação beber.

Pedras que se sobrepunham
Marcavam a direção,
Do tanque chamado Pote,
Cavado na depressão,
Onde exímios nadadores
Faziam exibição.

Além da Pedra do Pote
Também merece menção,
A Pedra das Lavandeiras
Com cores em profusão,
Onde se corava roupas
Depois de dar o sabão.

Outro ponto de destaque
A lagoa possuía:
Era o Poço dos Caboclos
E bem perto existia,
Salinas onde o nativo
Sal da terra extraía.

Ao avizinhar a chuva
Queimava-se a sujeira,
E a enchente do Belém
Carregava a podriqueira,
Que ao sair da lagoa
Caía na ribanceira.

Se a chuva demorava
A população sofria,
Pois a água pra beber
Só distante existia,
Em aguadas privativas,
Quando o dono consentia.

Diante do sofrimento
Restava apenas orar.
Descalços em procissão
Fervorosos a cantar,
O pé do Santo cruzeiro
Contritos iam molhar.

Por carreiros bem estreitos
Em filas se caminhava
Desde alta madrugada
Até que o sol entrava,
Na cabeça ou no ombro
A água se carregava.

Com a água das enchentes
Entulhos foram chegando,
E com o lixo de quintais
Foram se acumulando,
E o leito da lagoa
Mais raso foi se tornando.

Uma solução viável
Tomada sem relutar,
Foi construir a tapagem
Pra mais água represar,
E não faltar como sempre
Antes da chuva chegar.

Terminada a tapagem
A enchente não tardou,
E por perto da lagoa
Muita gente esperou.
Pelo Largo dos Tropeiros
A água se espalhou.

A construção da tapagem
A memória não olvidou.
Por ouvir contar, se sabe
Que ali se iniciou
A cina de uma jovem
Que a morte cedo levou.

E foi sem um plebiscito,
Até sem muito pensar,
Que o Poder Municipal
Achou por bem aterrar,
A lagoa que fez parte
Da vida deste lugar.

O sal da terra
Pág.: 50 a 51

Em tempos muitos remotos
Da vida do arraial,
Em um trabalho moroso
Todo ele manual,
Caboclos e os mais pobres
Do solo tiravam o sal.

O referido trabalho
Qualquer pessoa fazia.
Não exigia esforço,
Ciência não possuía.
Geralmente as mulheres
O ofício cometia.

Não se usava enxada
Para a terra juntar,
Acreditando que o ferro
Além de afugentar,
O sal a ser extraído
Pudesse contaminar.

De muares e quinos
As omoplatas se usava,
E numa destiladeira
Terra e água colocava,
A água lavava a terra
E em gotinhas pingava.

Aquela água salobra
Em vasilhas recolhida,
Transformava-se em sal
Ao se tornar ressequida,
Quando levada ao fogo
Ou quando ao sol mantida.

A qualidade do sal,
A sua coloração,
Estavam na procedência,
Local de fabricação,
Sendo o da Caiçara,
De maior aceitação.

O chamado sal da terra
Que aqui se extraía,
Em parte era usado,
Boa parte se vendia.
Pois o branco sal do mar
Pouca gente conhecia.

Dos pontos de extração
Um apenas é citado:
O do Poço dos Caboclos
Mais perto do povoado,
Local que por mais de século
De Salina foi chamado.

Capulhos Brancos
Pág.: 52 a 55
Base da economia,
Sempre foi o algodão,
Que plantado no baixio
Dava boa produção,
Com apenas as espécies
Rim-de-boi e maranhão.

Poucos tratos culturais
A lavoura exigia.
Com ciclo de cinco anos
A planta muito crescia.
Sem a lagarta rosada
Bons capulhos produzia.

Uma mínima proção
Do algodão produzido,
Destinava ao trabalho
Por mulheres exercido,
Indo do descaroçar,
Culminando no tecido.

Em um descaroçador
As sementes retiravam;
Com arco batiam a pluma;
Em roca ou fuso fiavam;
Redes, cobertas, toalhas,
Em um tear fabricavam.

As moças não precisavam
Nem deviam saber ler,
Para que aos namorados
Não soubessem escrever.
Todas tinham como dote,
Saber fiar e tecer.

Colhido em quantidade
O algodão cultivado,
Num sistema primitivo
Era beneficiado,
E em animais cargueiros
Logo era exportado.

Retirados os caroços,
A fibra era apertada
Numa prensa manual,
E em fardos transformada,
Pesando cinquenta quilos
E com couro capeada.

Com o decorrer dos anos,
Já não se usava mais
Velhos descaroçadores
Rústicos e manuais.
Outros maiores surgiram
Puxados por animais.

Usou-se força motriz,
Na usina algodoeira,
Que pra funcionamento
Contou com grande caldeira,
Tendo por proprietário,
O Doutor Mário Teixeira.

Transportou-se a caldeira,
Pesado material,
Com grande dificuldade
Em carreta especial,
Por juntas de boi puxada
Até a usina local.

Pelo Rio São Francisco
Em Malhada aportou,
E de lá até a Vila
Muitos dias se gastou,
Pois o transporte por terra
Mais difícil se tornou.

Mil, novecentos e doze,
Ano em que se montou,
A empresa Sertaneja
Que força motriz usou,
Modernizando o sistema
Que até então adotou.

Por vinte e cinco anos
A usina de algodão,
Além da torta e óleo
Também fazia sabão.
Foi vítima de dois incêndios
Mas retomou a ação.

O algodão, Ouro Branco,
Tem seu valor comprovado.
Das fibras, faz-se tecidos,
O caroço é usado
Na fabricação de óleo,
Torta ou fubá para o gado.

O valor medicinal,
Há muito se conhecia:
A folha, corta catarro,
E também disenteria.
O sumo cura feridas,
O dolorido alivia.

Em destaque na Bandeira,
Um galho de algodão
Reflete a importância
O valor da produção.
É a nossa homenagem
Expressa no pavilhão.

O Ponto de Encontro
Pág.: 56 a 60

Em tempos que anteciparam
A formação do arraial,
Existiam poucas casas
E um ponto comercial.
Fez-se então imperativa,
Uma feira semanal.

Chamava-se de Escambo,
O comércio que fazia,
Sem que houvesse dinheiro
Pois moeda não havia.
Os negócios eram feitos
Trocando mercadorias.

Libertando da usura
De um único vendeiro,
Reuniam-se feirantes
E primeiros bruaqueiros,
Na sombara e ao redor
Dum altivo umbuzeiro.

“Era na rua de Baixo
O descanso costumeiro,
Daqueles que viajavam
Levando animais cargueiros,
Por isso mudou-se o nome
Para Largo dos Tropeiros.

Pensando em maior lucro,
Transportavam os feirantes
O que tinham pra vender,
Pra outras feiras distantes
Em lombo de animais,
Numa viagem ofegante.

Vendeiros de Caetité,
Parateca e Urandi,
Monte Alto e Umburanas,
Pernoitavam sempre aqui.
Sendo esta a tradição
Da feira de Guanambi.

O dia estipulado
Para a feira semanal,
Sempre foi considerado
Bom fator comercial,
Por não haver neste dia
Feira em outro local.

Vasta coberta de palhas
Naquela praça existiu,
Até que um barracão
Que com telhas se cobriu,
Todo em madeira de lei
No mesmo local surgiu.

Por muitos e muitos anos,
Monte Alto dirigiu
A vila de Beija-flor,
Que em nada progrediu,
E contra aquele domínio
O povo se insurgiu.

Um político da terra
Pra fazer oposição,
Sugeriu a Monte alto
Transferir o barracão,
E a ordem expedida
Causou insatisfação.

Para a Baixa da Égua
Levar-se-ia o mercado,
E os buracos dos esteios
Logo foram perfurados,
Ao tempo em que na praça
Iniciava o mandado.

Ao lado do barracão
Um carro de bois estava,
E nele, o empreiteiro
A cancela colocava,
Quando Gustavo Bezerra
Do local se aproximava.

Foi como chefe político,
Homem sério e valente,
Que o coronel Bezerra
Demonstrou a toda gente,
Que não mais se cumpriria
Certas ordens do Intendente.

Surpreso e temeroso
O empreiteiro falou:
3/4 coronel, eu sou mandado.
3/4  pois outra ordem lhe dou:
Coloque já a cancela,
Conserte o que desmanchou.

Aqui vêm pernoitar,
Soldados e delegado
Para a ordem manter,
 Na mudança do mercado.
Mas ao andar pela rua
Um deles foi espancado.

Temendo a reação
Que iriam encontrar,
Bateram em retirada
Sem o barracão mudar,
E ao Intendente disseram
O que os fez retornar.

Foi aquela agressão
Uma forte advertência.
E não teve uma revanche
Por bom senso e prudência,
Pois se deduziu do fato
Anseios de Independência.

A feira foi se tornando
A maior deste sertão,
Com os produtos da terra
Arroz, milho, feijão,
Com a produção de peles
E o comércio de algodão.

Em nada os órgãos públicos
Davam contribuição,
Mas a feira atraiu
Pessoas da região.
Que tiveram na política
Grande participação.

Só no meado do século,
O Prefeito Municipal
Construiu outro mercado,
Bem abaixo do atual.
E para inaugurá-lo,
Lá se brincou carnaval.


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